segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Donald Son

Realmente, ouvir Grateful Dead faz com que meus neurônios fiquem mais em ebulição do que os de Bob Marley, depois de um catch a fire caprichado. Depois de um up in smoke. Depois das aventuras de Cheech and Chong.

Fico doidão. E, neste estado alterado, começo a divagar. Hoje, esta viagem mental levou-me até o meu avô materno. Senhor Donald Son. Sim, este era seu nome. Na verdade, era uma corruptela: Donalson. Donalson Moreira Lima.

Seu Donalson teve vida dura. Veio do campo, com 7 filhos na bagagem, juntamente com sua esposa, Vovó Maria. A vida pro seu Donald Son não foi mole. Desde o início, lá no Espírito Santo, ele "pelejava no campo". Cuidava das terras que o Pai de vovó Maria, então grande plantador de café do Vale do Paraíba, havia deixado sob seu escrutínio.

Como 70% das famílias brasileiras na década de 50, a numerosa família de seu Donald Son mudou-se do campo para a cidade, em busca do sonho de viver em meio a um Brasil milagroso. Seu Donald Son então abriu uma mercearia. Um "armazém", uma "venda", como chamavam na época. E ela prosperou. Muito. E Donald pode criar seus 7 filhos com muita dignidade.

Já idoso, seu Donald Son perdeu uma perna. Sua única filha mulher - minha mãe - até hoje defende a tese de erro médico. Eu não sei. Não era nascido. Logo, já conheci meu avô com perna mecânica. E era nessa perna de pau - engenhosamente articulada - que ele me colocava sentado, a olhar o movimento da rua e me falar da vida. Perguntava das minhas notas e do meu comportamento no colégio. As notas eram sempre boas, o que o orgulhava muito. O comportamento era "R", de regular (bondade das minhas professoras, pois eu merecia mesmo era "F" de fraco). Mas seu Donald Son não era bobo. Conhecia o neto. E ele me repreendia. "R é ruim", dizia meu velho avô de perna de pau.

E Donald Son, no final da tarde comia um prato de angu. Um reforço pros muques dizia ele. E, após comer, me mostrava o "batatão", fazendo o muque, contraindo o bíceps. Apesar de já velho, seu Donald era forte feito um touro. E pedia para que eu comesse bem, pra ter batatão também. Homem simples. Homem sábio.

Nunca perguntei-o o motivo do seu nome. A família era toda de portugueses. Por que Donald Son? Quem fora Donald? Meu bisavô? Nunca saberei. Ou melhor, não saberei com facilidade. Um dia achei nos alfarrábios de meu avô, perdido entre os livros em que ele anotava as vendas fiadas do armazém, um velho livro com a árvore genealógica da minha família. Eu era pequeno demais para guardar algum nome, ou história importante. Mas lembro que o livro tinha uma lombada grande, e a árvore era enorme. Isso dá combustível pra minha imaginação até hoje. Gosto de pensar que descendo de grandes homens. Homens com batatão. Simples e sábios.

E assim lembro de meu avô. Altivo, forte, calvo, em pé com a bengala que o ajudava a se apoiar na perna de pau, sempre escondida sob calças compridas passadas com esmero por Vovó Maria. E ele parava feito um cão de guarda na frente do prédio em que moravam. Uma sentinela. Parecia que dalí controlava a ordem do mundo. Que todas as coisas estavam sob seu domínio e responsabilidade. Seu olhar era duro e retesado. Enquanto isso, eu, criança pequena, brincava nos jardins, em meio a terra e planta. Virava e mexia seu Donald Son se virava, sol atrás de si, abrandava sua expressão, abria um sorriso e me fazia o muque a distância.

Eu, lá do fundo do jardim gritava, sorrindo: "batatão, vovô!"

Emenda ao Soneto

É, percebi que tenho que cumprir uma promessa.
Aziagos, vocês fizeram a sua parte. Esqueceram-me e assim, pude curtir minha viagem na devida paz. Faz-se necessário a contra-partida que prometi. Passem aqui em casa: tem chocolatinhos suíços e sacanagens do museu do sexo londrino.

Mas atenção. Só leva o chocolatinho se topar a novidade londrina.

Vão arriscar?

domingo, 20 de janeiro de 2008

The Boy's Back in Town

Certo, chega de moleza. Vamos reativar o Waru. Vamos jogar lenha, abanar o fogo. Estou de volta. Alive and kicking!

A semana imediatamente após a chegada da Europa foi corrida. Início de novo trabalho, colocar a vida em dia, pagar contas, etc. Mas vamos lá. Tem muitos "causos" pra contar.

E, como meus amigos aziagos foram muito - mas muito - gente boa comigo, e realmente retiraram a minha lembrança de suas mentes azaradas, a viagem correu numa boa. E, pra provar que iniciei 2008 com muita sorte, vos comunico que voltei de Madri pro Rio de primeira classe. Péra, vocês leram muito rápido e não registraram o que eu disse: voltei da Europa pro Brasil de Primeira Classe. Pagando precinho de econônima, claro!

Os detalhes de como demos essa borrada (por que cagada é pouco) eu conto posteriormente. Por hora quero relatar o meu conforto... Tudo começa com a poltrona, que reclinava até 180 graus e tornava-se uma perfeita cama. Tudo controlado por uns botoeszinhos no braço direito, bem ao lado do controle remoto da TV individual, que possuía um repertório vasto de bons filmes, músicas, jogos e leituras. Lá pelas tantas eu não resisti (e perdi o medo de mexer naquela parafernália de controles que a poltrona tinha) e arrisquei apertar o botaozinho misterioso, cujo ícone eu não fazia ideia do que significava. Pronto, a poltrona começou a massagear as minhas cansadas costas. Meu lombo agradeceu e não resisti. Caí no sono. Pouco tempo depois sou acordado pela aeromoça - muito delicada - perguntando se queria champagne, uísque, ou algum outro aperitivo antes do almoço. "errrr, no gracias, solo una coca-cola, por favor".

Pro almoço haviam 3 combinações de entradas, pratos principais, sobremesas, e até pro cafezinho (puro, com "leche" ou com "crema"). Impressionante. Tudo uma maravilha. Ah, perdoem-me. Esqueci de mencionar que, junto com os travesseiros e cobertores que as amigáveis comissárias nos entregaram, também veio um singelo "regalo". Uma necessaire de couro, com tudo que você pode ou não precisar durante o vôo. Desde escova e pasta de dentes até xampu (que ainda me pergunto por que estava lá...)

Realmente vale a pena assaltar um banco pra ser milionário. É assim que se viaja! É assim que se vive! Os espremidos numa lata de sardinha da classe econômica não fazem sequer idéia do que se passa na realeza. Enquanto a galera amargava uma fominha no meio do vôo, nós - da primeirona - tínhamos snack bar open, o vôo todo... Um exagero. Uma afronta.

Depois dessa, não tive dúvida. Ou todos os meus amigos morreram numa Tsunami que atingiu Niterói, ou realmente deixaram de focalizar seus maus flúidos na minha humilde pessoa. Sentí-me livre do peso de carregar o azar do mundo nas minhas (agora massageadas) costas.

Fenomenal.