domingo, 28 de setembro de 2008

A Draft of Reason

Mais uma experiência antropológica.

É inebriante observar o comportamento das pessoas há poucos minutos de uma prova. Eminentemente de um concurso público. É magnético. É divertidíssimo.

Pois bem, eram 7:50h da manhã de domingo. Os arredores do prédio já fervilhavam. Chegar de carro era um exercício de driblar flanelinhas camicazes, que se atiravam na frente do carro, oferecendo vagas. Após aparcar o carro num estacionamento - pois eu não vou sustentar esse mercado informal nojendo - e caminhar até o prédio da prova, fui subitamente, aplacado pela graça da situação.

Começa assim: você olha prum lado, vê um sujeito sentado no meio fio, tentando estudar nos últimos minutos que lhe restam. Mas tudo o que ele consegue é manter as várias folhas que tem no colo juntas, já que o vento teima e espalhá-las. Mais dois passos vejo um grupo de meninas de óculos. Todas. Elas debatem sobre as aulas do cursinho que fizeram, frenéticas. Fugi daquele zum zum zum de vozeszinhas finas estridentes. Mais a frente começou o freak show pra valer. Pois aí vieram os vendedores ambulantes, com seus isopores enormes. Tem gente que compra água, outros coca-cola. E os mais arrojados abrem uma skol, pra relaxar. Esses ganharam minha simpatia. Quase juntei-me a eles. É uma profusão de chicletes, halls, amendoins, club social, e por ai vai. Tem gente que vai às compras, literalmente. Satisfação geral dos camelôs. Dia de prova de concurso público é dia de faturar alto. Faturar em cima da ansiedade alheia. Féria gorda!

Na frente do prédio a multidão forma duas filas. Uma serpenteia pra direita, outra se espalha pra esquerda. Na minha habitual calma, pergunto a uns três sujeitos qual a diferença entre elas. O terceiro me disse que uma era pras escadas, a outra pros elevadores. Beleza, direcionei-me para a dos elevadores, já que meu andar era o 15o.

Nessa hora obtive a certeza de uma longa dúvida que tenho. Seguinte: sempre suspeitei que, havendo uma longa fila, que atrapalha a passagem de uma rua, ou fluxo qualquer de pessoas, o corte se dá na minha frente. Na minha pessoa. Então é aquele esbarra esbarra. Bolsada, chute, topada, tropeção, ombrada. Toda hora, de todos os lados, uma alma vem e pede licença pra passar na minha frente. Ou me surpreende vindo por detrás. É um pé no saco! Pois bem. Sempre suspeitei que tinha cara de porteiro. Hoje comprovei. O meu ponto na fila nem mesmo era o mais indicado para alguém que quisesse cruzar a linha de pessoas. Eu, sabendo dessa minha vocação, cheguei a me posicionar de forma a não deixar espaço pras pessoas passarem. Já para que elas, olhando de longe, achem outro ponto em que as pessoas na fila estejam mais distantes, dando passagem, e por lá façam seu caminho. Mas não adianta. Nego quer mesmo é passar por mim. Que porcaria irritante! Deve ser esse meu sorriso permanente na cara. Idiota.

Bem, a fila começou a andar e, depois de pegar muitos papéis inúteis oferecidos pelo caminho, ouvir o vendedor de caneta esferográfica preta e o de água fazerem muito terrorismo para venderem seus itens - no melhor discurso de marketing de guerra que eu já vi - consegui chegar ao elevador. De lá o corredor e, por fim, a sala.

Fui o primeiro a entrar. Achei meu lugar preferido, lá atrás, num canto, esquecido do mundo. Já que qualquer papel que caia no chão atrai a minha atenção, sempre opto por me espremer num canto pra cercear a desatenção. E de lá, no fundão, pude ver cada criatura que entrava. Que experiência! Ainda mais em sala de pessoas que optaram por carreira Publicidade. Entra a gorda alternativa, com mochila de bichinho. Entra o nerd espinhento. Entra o altão magricela. Entra a patricinha com cara amassada. Enfim, entra um zoológico que mais parecia a trupe do filme "Um estranho no ninho".

Os fiscais são um caso a parte. O careca e a suburbana gordosa. O careca se enrolou várias vezes. Deu o papel errado pruma penca de gente. Mandou assinar quando não devia. Mandou uns guardarem o celular num saquinho com lacre, outros não (eu não). A suburbana gordosa (que dormiu de roncar durante a prova) ensacava a bolsa e a mochila do povo que entrava. As pessoas iam se sentando. Um colocava suas compras na carteira imediatamente ao lado. Como se estivesse preparado para resisitir a uma hecatombe num bunker. 3 águas, um monte de nutris, biscoito goiabinha, halls. Outro perguntava "por que eu não posso ir ao banheiro agora?". Um gauche reclamava que não tinha carteira pra canhoto. Algumas meninas fofocavam com suas vozes irritantes ao meu lado. A maioria olhava aflita pro nada.

E eu, achando graça daquilo tudo, perdido nesta observação antropológica, rindo de mim mesmo. Rindo dos outros. Achando uma graça boba - quase tola - do que é o ser-humano num momento de tensão. Um rascunho de razão.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Escassez

Nestes tempos de escassez de posts, resta-me reproduzir abaixo uma frase muito marcante que lí num blog de um amigo.

"Não tem ninguém que saiba tudo, nem ninguém que não saiba nada: a inteligência está nas conexões."

Valeu ou não valeu a reprodução?